Salò, uma pequena cidade às margens do Lago de Garda, na região da Lombardia, tornou-se um dos símbolos mais sombrios da história italiana ao sediar, entre 1943 e 1945, a República Social Italiana (RSI), o último bastião do regime fascista de Benito Mussolini. Agora, um século depois de conceder ao ditador a cidadania honorária, o conselho municipal decidiu revogá-la.
Na sessão realizada nesta semana, o conselho municipal aprovou por doze votos a favor a moção apresentada por Tiberio Evoli, vereador da maioria de centro-esquerda. Três vereadores se opuseram e um se absteve, todos pertencentes a listas cívicas, incluindo um próximo ao partido Fratelli d’Italia. A decisão representa um gesto simbólico de distanciamento do passado autoritário da cidade.
A concessão da cidadania honorária a Mussolini ocorreu em maio de 1924, por iniciativa do comissário da prefeitura Salvatore Punzo, em um contexto de consolidação do regime fascista após a Marcha sobre Roma. Durante décadas, a presença desse título permaneceu como um vestígio do passado, mas foi apenas agora, em um momento de crescente revisão histórica na Itália, que sua revogação tornou-se uma realidade.
A decisão de Salò ocorre em um momento em que diversas cidades italianas vêm revisando honrarias concedidas a figuras polêmicas do passado. Em anos recentes, locais como Milão e Turim também revogaram prêmios e títulos conferidos a Mussolini.
No entanto, a medida ainda suscita polêmica. Setores da direita italiana, incluindo membros do Fratelli d’Italia, partido que atualmente lidera o governo nacional, consideram tais revogações uma tentativa de “reescrever a história”. Já para historiadores e ativistas antifascistas, trata-se de um passo necessário para afirmar os valores democráticos e consolidar uma leitura crítica do passado.
A revogação da cidadania de Mussolini em Salò não altera os eventos históricos, mas sinaliza uma mudança de postura em relação ao legado do fascismo na Itália. Cem anos depois, a cidade que um dia foi símbolo da república fantoche de Hitler agora tenta redefinir sua relação com a história.