A Itália atravessa uma grave crise demográfica que ameaça o mercado de trabalho e o sistema de pensões. O envelhecimento acelerado da população, a queda histórica da taxa de natalidade e a crescente emigração de jovens qualificados estão a reduzir rapidamente a população ativa do país, segundo estudo do Observatório de Contas Públicas de Itália.
O próprio governo de direita liderado por Giorgia Meloni, conhecido por seu discurso anti-imigração, reconhece a necessidade de atrair imigrantes. Em junho, anunciou a emissão de cerca de 500 mil novos vistos de trabalho para cidadãos de países fora da União Europeia no período entre 2026 e 2028. Além disso, uma lei publicada em novembro permite que descendentes de italianos de sete países Brasil, Argentina, Estados Unidos, Austrália, Canadá, Venezuela e Uruguai obtenham vistos de trabalho sem limite de quantidade por país.
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Segundo os economistas Giampaolo Galli, Nicolò Geraci e Francesco Scinetti, autores do estudo do Observatório das Contas Públicas, para combater o despovoamento e manter o sistema de serviços públicos em funcionamento, a Itália precisaria de receber pelo menos 10 milhões de imigrantes nos próximos 25 anos. Outros estudos apontam que seriam necessários 350 mil imigrantes líquidos por ano até 2035 e 480 mil por ano até 2050, totalizando cerca de 13,5 milhões de entradas líquidas no período.
A redução populacional já é visível: a população italiana caiu de 60,8 milhões em 2014 para menos de 59 milhões em 2024. O índice de envelhecimento dobrou nas últimas duas décadas, tornando a Itália o segundo país mais envelhecido do mundo, atrás apenas do Japão. Dados do Eurostat apontam que a idade média da população italiana é de 48,7 anos, com um quarto da população acima de 65 anos — duas pessoas idosas para cada jovem com menos de 15 anos.
A taxa de natalidade atinge mínimos históricos, com apenas 370 mil nascimentos em 2023 e uma taxa de fertilidade de 1,18 filhos por mulher. Em 2024, o país registrou aproximadamente 281 mil mortes a mais do que nascimentos. Paralelamente, a “fuga de cérebros” tem crescido: mais de 190 mil pessoas emigraram em 2024, a taxa mais alta em 25 anos, sendo que jovens entre 25 e 34 anos representam um terço desses migrantes, muitos deles licenciados.
O ministro das Finanças, Giancarlo Giorgetti, alertou recentemente no Parlamento: “A Itália está a envelhecer, as taxas de natalidade estão a cair, regiões inteiras do país estão a esvaziar-se. Estes números implacáveis devem servir de estímulo para a ação”.
O paradoxo enfrentado pelo governo é evidente. Embora precise de imigrantes para sustentar o mercado de trabalho e o sistema de pensões, sua política migratória tem sido marcada pelo endurecimento das regras, combate à imigração ilegal e políticas de repatriamento. Especialistas destacam que, sem um plano migratório estruturado, a população ativa, hoje responsável por 62% do total, poderá cair para 49% até 2100, tornando insustentável a carga sobre os serviços públicos e a segurança social.
A crise italiana evidencia o dilema entre retórica política e necessidades econômicas: atrair imigrantes é imperativo para evitar o colapso do sistema previdenciário e garantir a sustentabilidade do país, mas a realidade política permanece marcada por um discurso anti-imigração vigoroso.






























