Enquanto milhares de italianos continuam a deixar o país em busca de oportunidades, a Grécia dá sinais de recuperação e passa a atrair seus cidadãos de volta. O que explica essa inversão? E o que a Itália pode fazer?
O que é a “fuga de cérebros” e por que isso preocupa?
A expressão “fuga de cérebros” descreve um fenômeno em que pessoas qualificadas geralmente jovens com formação técnica ou superior decidem sair de seu país de origem para viver no exterior, em busca de melhores condições de vida, salários mais competitivos, estabilidade política e oportunidades profissionais.
No caso da Itália, essa tendência tem se mantido há mais de uma década. Os dados mais recentes do Eurostat, o órgão estatístico da União Europeia, mostram que mais de 114 mil italianos deixaram o país em 2023, enquanto apenas 61 mil retornaram. No acumulado entre 2009 e 2023, cerca de 1,4 milhão de pessoas saíram da Itália.
Essa saída em massa de talentos afeta diretamente o desenvolvimento econômico e social do país. Profissionais que poderiam contribuir com inovação, pesquisa, empreendedorismo e crescimento acabam fortalecendo os mercados de outros países.
A Grécia conseguiu inverter a tendência
Enquanto a Itália segue enfrentando esse desafio, um país vizinho na Europa surpreendeu positivamente. A Grécia, após anos de crise econômica e austeridade, conseguiu pela primeira vez desde 2008 reverter o fluxo migratório.
Segundo o Eurostat, em 2023, 47 mil gregos retornaram ao país, superando os 32 mil que saíram. É a primeira vez, em mais de 15 anos, que o país registra mais retornos do que partidas. O feito foi celebrado em junho pelo vice-primeiro-ministro grego, Kostis Hatzidakis, como um marco de mudança de ciclo.
Como a Grécia conseguiu trazer seu povo de volta?
Essa reversão não aconteceu por acaso. O governo grego implementou uma série de medidas práticas e incentivos concretos para tornar o país mais atrativo para os que vivem no exterior:
1. Incentivos fiscais para quem retorna
Profissionais que voltam a viver na Grécia podem usufruir de redução de impostos sobre a renda por até 7 anos, além de isenções sobre ganhos obtidos no exterior.
2. Melhora da situação econômica
Após anos de recessão, a Grécia conseguiu recuperar parte da sua credibilidade internacional. O crescimento do PIB voltou a ser positivo, a inflação caiu e as perspectivas de investimento melhoraram. Isso elevou a confiança dos cidadãos que vivem fora.
3. Políticas para reintegração
Foram criados programas de apoio para o retorno e a reintegração de profissionais qualificados, incluindo suporte para empreendedores que desejam abrir negócios e valorização de perfis com experiência internacional.
4. Ambiente de inovação
A Grécia também buscou atrair empresas de tecnologia e hubs de inovação, criando oportunidades para jovens profissionais qualificados que antes só encontravam esse cenário no exterior.
E a Itália? Por que continua perdendo talentos?
Ao contrário da Grécia, a Itália ainda carece de uma política coordenada para enfrentar a fuga de cérebros. Os fatores que levam os italianos a saírem do país permanecem inalterados:
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Altos níveis de desemprego entre jovens, especialmente no sul do país;
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Burocracia pesada para empreendedores e profissionais autônomos;
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Salários baixos e contratos instáveis, mesmo para pessoas com diploma universitário;
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Falta de reconhecimento e valorização da experiência profissional adquirida no exterior.
Além disso, o debate político na Itália tende a focar mais na entrada de migrantes do que na saída de italianos, embora ambas as questões estejam ligadas à saúde econômica e demográfica do país.
O que a Itália pode aprender com o modelo grego?
A experiência grega oferece um caminho viável e não necessariamente complexo para mudar a rota:
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Implementar incentivos fiscais para repatriados, especialmente jovens e profissionais de áreas estratégicas;
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Criar programas nacionais de reintegração e aproveitamento da experiência adquirida no exterior;
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Investir em setores de alta tecnologia e atrair empresas que ofereçam empregos qualificados;
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Reformar o sistema universitário e as oportunidades de carreira no setor público e privado.
Em suma, é preciso mostrar aos italianos que vale a pena voltar. Isso exige mais do que discursos patrióticos: exige estratégia, estabilidade e oportunidade real.
Ainda há tempo para reverter?
A resposta é sim, mas o tempo está passando. Se a Grécia um país que passou por uma das maiores crises econômicas da Europa conseguiu recuperar parte de sua população qualificada, a Itália também pode conseguir.
O desafio é transformar a saída silenciosa de italianos em um retorno consciente e incentivado. Para isso, será preciso mais do que promessas: será necessário agir com visão e coragem política.