O novo decreto de fluxo para entrada de trabalhadores estrangeiros, aprovado pelo governo italiano, promete ampliar as cotas para o Vêneto, mas empregadores e sindicatos já alertam: o sistema está ultrapassado e não atende às necessidades reais do mercado de trabalho regional.
Segundo estimativas da Confindustria Veneto, o decreto deve aumentar o número de trabalhadores estrangeiros autorizados para pouco mais de 18 mil, entre sazonais e não sazonais, um crescimento modesto frente aos quase 25 mil necessários, e muito distante dos 165 mil autorizados para toda a Itália nos próximos três anos.
O Sistema do “ClickDay” e Suas Limitações
A principal ferramenta do decreto é o chamado “ClickDay” – uma data definida em que as empresas devem formalizar rapidamente suas solicitações de contratação. Contudo, segundo Maurizio Basso, delegado da Confindustria Veneto para Trabalho, Formação e Educação, o método privilegia a rapidez e a sorte em detrimento do mérito e das reais necessidades. “O sistema não garante horários certos nem percursos confiáveis para as contratações”, ressalta Basso.
Mario Roberto Carraro, vice-presidente da Confindustria Vicenza, reforça a crítica e sugere um modelo alternativo: “Precisamos de um sistema baseado em solicitações concretas das empresas, com critérios qualitativos como função exigida, localização, competências e duração dos contratos, além da possibilidade de contratação durante todo o ano”.
Outro ponto levantado pelos empregadores é a aplicação do decreto de Cutro, que prevê entradas extras para trabalhadores estrangeiros que participam de cursos de formação em seus países de origem, como forma de suprir a demanda.
Sindicatos Apontam Fracasso e Propõem Anistia
Do lado sindical, o diagnóstico é ainda mais grave. Silvana Fanelli, da CGIL Veneto, classifica o decreto como um fracasso. Ela destaca que, apesar do aumento nas cotas, a realidade mostra que mais da metade das vagas permanecerá vaga. Isso porque apenas metade das candidaturas recebe sinal verde, e a burocracia dificulta a assinatura dos contratos — que ocorrem entre 9% e 12% das vezes.
“O sistema parte da premissa equivocada de que os trabalhadores estão no exterior, o que não é verdade. É necessária uma anistia similar à da pandemia, revisão da lei Bossi-Fini e autorização temporária para busca de emprego”, defende Fanelli.
Agricultura: Urgência e Burocracia em Conflito
No setor agrícola, que depende fortemente da mão de obra sazonal, a situação é crítica. Maurizio Antonini, diretor da CIA Veneto, destaca a necessidade urgente de 20 a 25 mil trabalhadores para a colheita de frutas e legumes. Apesar de reconhecer o aumento das cotas, ele reclama da lentidão das autoridades em liberar as autorizações.
“Ao final de fevereiro, poucas autorizações haviam sido emitidas, mesmo com a proximidade da época de colheita. Muitos trabalhadores são recontratados pelas mesmas empresas anualmente, e a demora impacta diretamente a produção”, explica Antonini.
A Coldiretti também enfatiza a insuficiência dos números e a burocracia como obstáculos principais. São necessários 30 mil trabalhadores sazonais no Vêneto, incluindo 13 mil só em Verona para fruticultura, horticultura e vinhedos. “Precisamos de prazos específicos para a chegada dos trabalhadores, mas atrasos nos vistos impedem isso. Em meio a problemas de ilegalidade e exploração, é vital fortalecer os mecanismos legais para proteger todos os envolvidos”, afirma a entidade.
Perspectivas e Desafios
Apesar da trégua oferecida pelo aumento das cotas, a realidade indica que a escassez de mão de obra no Vêneto continuará a ser um problema estruturante. A convergência entre sindicatos e empregadores em criticar o sistema vigente sinaliza a urgência de reformas que tornem o processo mais eficiente, justo e alinhado com as demandas reais.
Enquanto isso, o relógio corre contra o setor produtivo e agrícola da região, que precisa de soluções rápidas para evitar prejuízos econômicos e sociais. A pressão está posta sobre o governo para que vá além das medidas paliativas e ofereça respostas concretas e ágeis.