No seu 11º discurso como Presidente da República, Sergio Mattarella abriu a fala destacando a urgência da paz. O chefe de Estado recordou as imagens das casas e infraestruturas devastadas pelos bombardeios na Ucrânia, a destruição de usinas que deixa famílias inteiras — crianças, idosos, mulheres e homens — expostas ao frio, e a catástrofe humanitária em Gaza, onde recém-nascidos morrem congelados. Diante desses cenários, disse Mattarella, o desejo de paz cresce e torna incompreensível a recusa de quem a nega por se achar mais forte.
Para o Presidente, a paz é também “um modo de pensare”: viver junto aos outros com respeito, sem pretender impor vontades, interesses ou domínios. Recordou ainda palavras do Papa que salientaram a necessidade de “desarmar as palavras” e convidou todos a afastar um sentimento fatalista de impotência frente aos acontecimentos.
O núcleo do discurso foi dedicado aos 80 anos da República. Mattarella enfatizou que, embora oito décadas sejam pouco na grande história, foram “dezenas de anos de elevado significado”. Lembrou que a República nasceu com um primeiro fotograma dedicado às mulheres: o voto feminino, pela primeira vez, marcou simbolicamente a unidade do povo e conferiu à República um caráter democrático indelevel.
O Presidente enalteceu a Constituição como guia e inspiração do país desde então, definindo a República como um divisor de águas na história italiana. Ao revisitar os anos que vão de 1946 até hoje, Mattarella mencionou questões contemporâneas que permanecem centrais: saúde, moradia, trabalho, previdência e a informação, lembrando o papel da RAI como serviço público e garantia de pluralismo.
Mattarella não esqueceu as feridas dos anos de violência: as stragi e o terrorismo. Pediu a lembrança dos rostos e nomes das vítimas — magistrados, jornalistas, servidores públicos, membros das forças de segurança — e lamentou especialmente os jovens mortos por ideologias que cultivam a violência. Essas épocas foram chamadas de “a noite da República”, mas, segundo o Presidente, a Itália prevaleceu: as instituições se mostraram mais fortes que o terror, graças à unidade das forças políticas e sociais em defesa dos princípios fundadores da República.
Dois nomes foram destacados como referências permanentes de legalidade: Giovanni Falcone e Paolo Borsellino. Seu exemplo, afirmou Mattarella, permanece inspirador não apenas na Itália, mas também para as gerações que se recusam à prepotência do crime organizado.
Ao tratar das grandes transformações que marcaram a passagem para o novo milênio, o Presidente observou mudanças profundas no linguajar, nos estilos de vida e até na moeda, reconhecendo ao mesmo tempo lacunas e contradições da trajetória nacional. Apesar das insuficiências, reafirmou a solidez das instituições e a importância de continuar o trabalho coletivo de consolidação dos direitos e do bem comum.
Dirigindo-se diretamente aos jovens, Mattarella lançou um apelo claro: sejam exigentes, sejam corajosos, escolham o próprio futuro. Convocou as novas gerações a participar ativamente na construção do país, não se resignando e cultivando a responsabilidade cívica.
O discurso evocou memória, responsabilidade e esperança: memória das vítimas e dos passos que constituíram a República; responsabilidade na defesa da lei, das instituições e dos direitos; e esperança na capacidade das novas gerações de escolher e edificar um futuro de paz, justiça e cidadania plena.































