Como viajante sempre em busca de experiências que aquecem a alma, descobri que o verdadeiro espírito do Natal pulsa forte nos Borghi più belli d’Italia. Longe das luzes impessoais das grandes cidades, esses vilarejos preservam ritos, sabores e ofícios antigos que transformam cada passeio em uma imersão poética na cultura local. Entre ruas de pedra, praças iluminadas e cheiros de especiarias, o Natal ganha formas genuínas que convidam à contemplação e à convivialidade.
No coração das Dolomitas, Mezzano di Primiero revela um dos gestos natalinos mais simbólicos e surpreendentes: o famoso Albero delle radici, uma árvore «invertida» de 16 metros que exibe suas raízes, evocando origem e identidade. Iluminada até o dia 7 de janeiro, essa instalação simboliza a ligação entre passado e presente e vira ponto de encontro para famílias e visitantes curiosos. Ao redor, a intervenção Cataste&Canzei transforma simples pilhas de lenha em obras de arte: ao longo do percurso, cerca de trinta instalações artísticas convidam à contemplação do trabalho manual e da criatividade local.
Durante as festas, uma pequena casinha junto ao Albero delle radici oferece um gesto intimista: numa bússola montada ali, cada pessoa pode depositar pensamentos e desejos, compondo um mosaico coletivo de memórias e esperanças — um detalhe que, como viajante, achei profundamente comovente. O aroma do vin brulè, as vozes que cantam músicas populares e o burburinho das oficinas artesanais completam esse cenário, lembrando que o Natal, antes de tudo, é encontro.
Mais ao sul, no Trentino, o antigo borgo de Canale di Tenno encanta por suas casas de pedra, vicoli tortuosos e pátios secretos que parecem saídos de um livro de contos. Caminhar por seus labirintos é reencontrar o tempo: portais decorados, varandas floridas—mesmo no inverno—e pequenos ateliês onde artesãos mantêm técnicas ancestrais. A atmosfera é ideal para se perder entre luzes quentes e descobrir presentes únicos feitos à mão.
Em todos esses vilarejos, o que mais me fascina é a possibilidade de vivenciar tradições enraizadas, muitas vezes ligadas à culinária. Provar receitas familiares, preparadas com ingredientes locais e segredos transmitidos de geração em geração, é parte central da experiência natalina. Pães doces, biscoitos aromatizados, queijos e compotas aparecem lado a lado com pratos salvos na memória de cada família, e os mercados locais se tornam vitrines de autenticidade.
Os artesãos são protagonistas: vimos tecelões, ceramistas, marceneiros e ferreiros abrindo as portas de suas oficinas para mostrar técnicas, contar histórias e ensinar pequenas partes do ofício. Essas conversas revelam a dimensão humana do artesanato e o porquê de tantos visitantes preferirem levar um objeto com alma do que uma lembrança genérica de centro comercial.
Além do artesanato e da gastronomia, a música popular e os ritos religiosos e folclóricos imprimem ao período natalino um caráter comunitário inconfundível. Concertos em igrejas históricas, corais locais e reconstituições de presépios contribuem para um calendário repleto de emoções. Como turista, senti que cada evento, por menor que fosse, carregava uma intensidade que só se encontra quando se respeita a memória coletiva.
Se você planeja uma viagem de Natal pela Itália, recomendo reservar tempo para se permitir descobrir cada detalhe: sentar num café à beira da praça e observar as rotinas, conversar com pessoas que moram ali, participar de oficinas e, claro, provar as especialidades. É nessa prática lenta que o espírito natalino se revela — não como espetáculo, mas como vida cotidiana elevada pela celebração.
Algumas dicas práticas que colhi durante as visitas e quero compartilhar com quem ama viajar com olhos atentos:
- Procure os mercados locais e ateliês: são os melhores lugares para encontrar presentes autênticos e apoiar a economia dos borghi.
- Verifique horários das igrejas e pequenos concertos: muitas vezes há apresentações religiosas e corais que não estão amplamente divulgadas online.
- Experimente as receitas locais nas trattorie e nas casas de família; reserve com antecedência em vilarejos muito procurados.
- Se puder, visite durante a semana para evitar aglomerações de fim de semana e desfrutar de uma experiência mais íntima.
- Leve calçado confortável: as ruas de pedra pedem passos lentos e atenção aos detalhes.
Ao final de cada dia, o que fica é uma sensação de pertença: mesmo sendo visitante, é possível ser acolhido pelas comunidades que mantêm viva a tradição natalina. A beleza desses borghi está justamente nessa combinação de preservação cultural e hospitalidade — um convite irresistível para quem busca um Natal com significado.
Como viajante encantada, recomendo incluir no roteiro pelo menos dois ou três vilarejos distintos. A diversidade de paisagens — montanha, colina, litoral — e de tradições regionais faz com que cada parada acrescente camadas novas à experiência. E se houver a oportunidade de participar de alguma oficina ou evento local, agarre-a: são essas vivências que transformam uma viagem em memória duradoura.
Por fim, não deixe de registrar os pequenos rituais — a iluminação das janelas, as vozes ao longe, as mãos que moldam e tecem — que compõem a tessitura do Natal nos Borghi più belli d’Italia. Eles nos lembram que a verdadeira luz das festas vem da cultura, da memória e dos laços entre as pessoas.
Fonte: ANSA – Lo spirito del Natale nei borghi più belli d’Italia































