A primeira-ministra italiana Giorgia Meloni discursou nesta segunda-feira no Senado, destacando o agravamento do cenário geopolítico no Oriente Médio e suas implicações para a Europa. Em fala firme, Meloni reiterou que o atual caos na região não se originou nas decisões do ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e apontou um elemento novo e relevante: divisões internas no Irã em relação à manutenção de uma trégua.
“O Irã violou a trégua. Israel pode responder, espera-se que de forma proporcional. Agora a situação se complicou”, afirmou Meloni, em referência às comunicações preparatórias ao Conselho Europeu.
Apesar da escalada, a líder do governo italiano sinalizou uma abertura: “Após a violação, o Irã confirmou seu desejo de uma trégua, o que pode ser interpretado como uma divisão no cenário interno iraniano. Isso deve ser considerado”. A leitura da primeira-ministra sugere uma possível brecha diplomática, ainda que tênue, para conter o ciclo de hostilidades.
Clima tenso no Parlamento e divergências na oposição
O pronunciamento de Meloni ocorreu num contexto de alta tensão política. A maioria de centro-direita conseguiu aprovar, em votação aberta, a resolução de apoio às comunicações da chefe de governo. Já as propostas das demais forças de oposição foram sistematicamente rejeitadas, com exceção de trechos reformulados da moção apresentada pela Azione, que aceitou sugestões do governo para obter parecer favorável.
O Movimento 5 Estrelas (M5S) manteve sua postura crítica e apresentou uma resolução controversa, solicitando a interrupção do envio de material militar à Ucrânia e a reabertura do debate sobre a colaboração energética com a Rússia — pontos que acirraram os ânimos dentro da própria oposição. Tanto o Partido Democrático (PD) quanto a Aliança Verdes e Esquerda (Avs) votaram contra o texto, denunciando ambiguidade em relação ao alinhamento europeu e à política externa da Itália.
Giuseppe Conte reage: “Uma armação engenhosa”
O ex-primeiro-ministro Giuseppe Conte, líder do M5S, reagiu com dureza às críticas que recebeu. Em entrevista ao canal La7, feita por videoconferência diretamente de Haia, acusou os adversários de encenarem um mal-entendido deliberado:
“Essa proposta foi apresentada em fevereiro. Ou não a leram ou fingiram não tê-la lido. O texto parte de uma perspectiva de paz duradoura. É natural que, em tal cenário, as relações comerciais com a Rússia possam ser restabelecidas”, defendeu.
A fala foi interpretada por analistas como mais um passo do M5S rumo a uma política externa que busca marcar distância tanto do atlantismo automático quanto do isolacionismo.
Defesa, gastos militares e a narrativa dos 2%
Ainda na mesma entrevista, Conte voltou a abordar a polêmica dos 2% do PIB em gastos com defesa, compromisso assumido pela Itália no âmbito da OTAN:
“Não assinei nenhum 2%. Essa meta foi definida em 2014, quando eu sequer estava na política. Sempre afirmei que não se pode investir em armamentos enquanto se sacrifica a população. Para cada bilhão na defesa, investi doze na saúde”.
O ex-premiê tenta, com isso, se distanciar de acusações de inconsistência e preservar sua base popular, cada vez mais sensível aos impactos sociais das decisões de política internacional.
Governo acena à Azione, mas impõe ajustes
A única abertura parcial por parte do governo ocorreu com a resolução apresentada pelo partido Azione, à qual o Executivo deu sinal verde após impor cortes e ajustes. Os trechos mais sensíveis foram:
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A exclusão da expressão “por quaisquer meios” na defesa da soberania ucraniana;
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A retirada da menção à Autoridade Nacional Palestina como “única representante legítima” do povo palestino.
Essas mudanças refletem a tentativa do governo de evitar posições unilaterais e manter espaço para flexibilidade diplomática em futuras tratativas europeias. As próximas semanas devem ser decisivas para avaliar se as declarações de trégua e os acenos diplomáticos se converterão, de fato, em ações concretas ou se o impasse político e os jogos de retórica continuarão a ditar o ritmo do debate.
A análise do discurso da Meloni evidencia a complexidade da situação geopolítica atual, especialmente com as divisões internas no Irã. A postura firme, mas cautelosa, do governo italiano mostra a difícil busca por equilíbrio entre segurança e diplomacia, enquanto o cenário político interno reflete tensões que podem influenciar diretamente as decisões futuras.