Enquanto a União Europeia discute um possível plano comum de rearmamento, a Itália avança de forma decisiva em duas frentes: o fortalecimento das suas missões militares no exterior e o aumento expressivo de suas exportações de armamentos. O Parlamento italiano acaba de aprovar a renovação das missões militares até o final de 2025, com um orçamento que se aproxima de 1,5 bilhão de euros, além de novas metas ambiciosas de investimento na defesa.
Ao mesmo tempo, dados oficiais revelam que 2024 foi um ano recorde para a exportação de armas italianas, atingindo o montante de 8,69 bilhões de euros em autorizações – um salto de 25% em relação ao ano anterior.
Missões externas: um compromisso crescente
O governo Meloni autorizou a continuidade de mais de 30 operações internacionais, mobilizando 2.867 soldados e implementando uma nova força com “alta e muito alta prontidão operacional”, integrada aos mecanismos de reação rápida da OTAN. Esta força sozinha consumirá 30 milhões de euros adicionais, segundo o plano aprovado.
As operações militares italianas se estendem por zonas estratégicas e instáveis como os Balcãs Ocidentais, Ucrânia, Líbia, Líbano, Gaza e Chifre da África. O foco permanece claro: reforçar o papel da Itália no flanco sul da OTAN e consolidar sua presença geopolítica no Mediterrâneo e no Oriente Próximo.
O relatório das Comissões de Relações Exteriores e de Defesa do Parlamento revela que a Itália quer ser protagonista num possível cenário de pós-guerra na Faixa de Gaza, propondo uma administração interina do território. Em paralelo, reforça seu apoio à estabilização da Líbia, mantendo cooperação com autoridades locais, inclusive através da Guardia di Finanza, encarregada do controle marítimo e da luta contra o tráfico de migrantes.
Entretanto, esse apoio não é isento de críticas. Diversos relatórios da ONU e decisões do Tribunal Penal Internacional alertam para as contínuas violações de direitos humanos cometidas por milícias líbias, com as quais a Itália mantém colaboração operacional.
O outro front: lucros com armas
O Relatório Anual de Exportações Militares de 2024, prestes a ser enviado ao Parlamento, indica que a indústria de defesa italiana nunca se beneficiou tanto do contexto global de rearmamento. As autorizações de exportação individual cresceram 35% em um ano, chegando a 6,45 bilhões de euros.
A Itália agora figura como o sexto maior exportador de armamentos do mundo, segundo o SIPRI (Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo), com um crescimento de 132% na última década. Além da exportação direta, o relatório aponta o envolvimento crescente de bancos italianos no financiamento dessas operações, fortalecendo o setor como um pilar da economia nacional.
E Israel?
Apesar do embargo formal de armas contra Israel, dados da Agência Aduaneira indicam que, em 2024, foram realizadas 212 operações de exportação de material militar para o país, totalizando 4,2 milhões de euros, com base em licenças concedidas em anos anteriores.
Além disso, a cooperação bélica bilateral não parou: a Itália emitiu 42 novas autorizações de importação de armamentos israelenses, no valor de 155 milhões de euros. Outros 37 milhões de euros em armas foram fisicamente importados de Israel ao longo do ano.
Para Francesco Vignarca, coordenador da Rede Italiana de Paz e Desarmamento, esse cenário mostra como a Itália busca “lucrar ano após ano com o aumento dos gastos militares globais”, mesmo sem atingir os contratos bilionários de dez anos atrás.
Próximos passos: 2% do PIB em defesa
No horizonte imediato, o governo italiano promete alinhar-se às metas da OTAN. Segundo o ministro da Economia, Giancarlo Giorgetti, o país deverá atingir até o final de 2025 o objetivo de destinar 2% do PIB aos gastos militares – algo até agora inédito para a Itália.
Em meio à pressão internacional, instabilidade regional e novos investimentos em defesa, Roma se reposiciona no tabuleiro da segurança internacional: como um aliado estratégico da OTAN, fornecedor ativo de armamentos e operador militar em múltiplos teatros de crise. Uma equação que promete gerar debate – e consequências.