Na última audiência da Comissão de Assuntos Constitucionais do Senado, o conselheiro do Conselho Geral dos Italianos no Exterior (CGIE), Daniel Taddone, expressou sua preocupação sobre os recentes movimentos legislativos que poderiam afetar a transmissão de cidadania italiana, especialmente no contexto da cidadania ius sanguinis. Seu discurso traz à tona questões essenciais sobre o impacto de um novo decreto-lei na vida das comunidades italianas no exterior, com implicações para aqueles que, ao longo de gerações, têm transmitido sua cidadania a filhos e netos.
O Impacto do Decreto-Lei
A pergunta central levantada por Taddone foi direta e repleta de angústia: “Como um decreto-lei pode, da noite para o dia, anular a minha possibilidade de transmitir a cidadania italiana a um novo filho?”. A dúvida é legítima, visto que, em um país como a Itália, onde a cidadania é frequentemente transmitida de geração em geração, um decreto-lei pode, de fato, reverter as expectativas legais de milhares de cidadãos e suas famílias, criando incertezas legais e desafios para aqueles que não vivem no território italiano, mas que têm laços profundos com o país.
Esse questionamento se baseia no conceito de ius sanguinis, que é a base do direto de sangue, em que a nacionalidade é transmitida aos filhos independentemente de onde nasçam, desde que provindos de pais italianos.
O “Território” e a Cidadania: A Opinião de Taddone
Taddone, em sua fala, refutou a ideia de que a cidadania italiana deveria estar atrelada à residência no território nacional. Segundo o conselheiro, a ideia de que a cidadania seria limitada àqueles que vivem ou passaram um longo período na Itália não faz parte da visão do legislador italiano e é, em sua opinião, um erro conceitual. “Não tenho a possibilidade de viver dois anos na Itália, a ideia de território na cidadania italiana nunca existiu, o legislador nunca a quis”, afirmou, ressaltando que a cidadania deve ser um direito baseado na descendência e nos laços familiares, não em um critério territorial que nunca fez parte da legislação original.
Esse ponto é crucial, pois, ao introduzir requisitos de residência ou vínculos territoriais para a transmissão da cidadania, o novo decreto-lei alteraria profundamente a lógica que rege a cidadania italiana, afetando diretamente as comunidades italianas no exterior, que, em muitos casos, nunca tiveram a possibilidade de estabelecer uma conexão física constante com o território italiano.
Acompanhem o perfil do Instagram do Conselheiro no CGIE (Consiglio Generale degli Italiani all’Estero) – Daniel Taddone.
A Reação ao Decreto-Lei e o Descontentamento das Comunidades
O discurso de Taddone também abordou a falta de diálogo e consideração das comunidades italianas no exterior. O conselheiro criticou duramente a postura do Ministro das Relações Exteriores da Itália, Antonio Tajani, durante uma coletiva de imprensa, na qual, segundo Taddone, não houve qualquer menção positiva ou reconhecimento das necessidades das comunidades italianas fora da Itália. “O Ministro Tajani, nos 18 minutos e 27 segundos de sua coletiva de imprensa, não dirigiu uma única palavra positiva às nossas comunidades. Esta é uma ferida aberta em nossa diáspora que teremos um pouco de dificuldade para curar. Espero que o Parlamento o faça, porque em nossas comunidades ele foi recebido com muita, muita tristeza”, disse o conselheiro.
Esse descontentamento reflete a frustração de muitos cidadãos italianos e descendentes, que sentem que suas contribuições para o país e sua ligação com a cultura italiana não são reconhecidas adequadamente pelas autoridades locais. O sentimento de abandono é profundo, especialmente quando uma medida legislativa pode afetar direitos adquiridos de longa data, sem um diálogo real com as comunidades afetadas.
A Proposta de Taddone: A Necessidade de Reforma no Sistema
Taddone também não se limitou a apontar problemas, mas propôs uma solução para mitigar o impacto do novo decreto-lei. Segundo ele, o sistema atual de reconhecimento da cidadania italiana é arcaico e sobrecarregado, o que leva a atrasos e falhas no processo de reconhecimento. Em vez de impor novas restrições, o conselheiro sugere que o Estado italiano reforme o sistema e abra novas possibilidades para tornar o processo mais ágil.
Ele mencionou a irretroatividade da lei como outro ponto crítico. A proposta de Taddone é que a cidadania italiana não seja retirada de quem já a possui ou tem o direito de obtê-la com base em critérios de ius sanguinis, como seria o caso de um novo filho nascido de pais italianos, mesmo que esses pais não tenham vivido na Itália. Além disso, ele sugeriu a introdução de um sistema de verificação efetiva, no qual os vínculos com a Itália sejam reconhecidos de forma mais flexível, respeitando a realidade das comunidades no exterior.
O Futuro da Cidadania Italiana
O discurso de Taddone lança luz sobre uma questão que vai além da simples mudança legislativa: ele reflete uma conflitante visão sobre o que significa ser italiano no século XXI. A cidadania italiana, que é um direito de sangue, está sendo confrontada com uma realidade política e social que pode prejudicar as gerações futuras, especialmente aquelas que estão fora da Itália, onde os nascidos de italianos apenas necessitavam reivindicar o reconhecimento da cidadania italiana.
À medida que a discussão sobre o decreto-lei avança, é essencial que o Parlamento italiano considere os impactos dessas mudanças para as comunidades italianas no exterior, evitando decisões apressadas que possam gerar mais conflitos do que soluções. A adaptação de um sistema de cidadania que seja inclusivo e respeite as tradições, mas que também leve em conta as necessidades do mundo moderno, será fundamental para que as futuras gerações italianas, em qualquer parte do mundo, continuem a se sentir parte da nação.
Este é um período conflitante, marcado por uma maré cheia de incertezas, e continuaremos atentos aos próximos passos e desdobramentos dessa situação, na esperança de que o futuro traga soluções justas para todos os afetados.